Multirreferencialidade

Em agosto de 1998, como professor do Programa de Pós-Graduação da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), concluindo a coordenação e edição do livro “Multirreferencialidade nas ciências e na educação”, participação especial de Sidney Barbosa, responsável por parte da tradução e revisão de todo o trabalho, já que se tratava de uma tradução, escrevia na última página um breve texto com o subtítulo acima, intentando resgatar o processo vivido até o momento da publicação dessa obra.

 

Afirmava que tudo começou com a vinda ao Brasil, do professor Renè Barbier, da Universidade Paris 8, em agosto de 1992, idealização de Sérgio Borba que, à época, encontrava-se como professor visitante do Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT). Também eu até aquele ano era professor dessa mesma Universidade, pois foi em 1992 que me transferi, após concurso, para a UFSCar.

 

Sérgio Borba insistia em oportunizar a vinda de Renè Barbier ao Brasil, e solicitou minha participação para juntos pensarmos e programarmos tal realização. A primeira ideia foi encontrar e aglutinar pesquisadores e profissionais que tivessem interesse nas discussões que Renè Barbier desenvolvia, para que pudéssemos explorar ao máximo de sua presença entre nós. Por estar me transferindo para a UFSCar, minha contribuição foi encontrar um espaço onde pudéssemos desenvolver os trabalhos previstos com a presença do professor convidado, e o mesmo aconteceu na Universidade de São Paulo (USP), com a participação de Maria Cecilia Sanches Teixeira, professora da Faculdade de Educação, desta Instituição.

 

Foi de extrema felicidade este esforço inicial pensado de forma intuitiva, mas multirreferencial, pois tratou-se de um evento realizado de forma plural e aglutinadora de profissionais que, no decorrer do processo, foram se tornando parceiros e produtores/disseminadores desta abordagem, até aquele momento, pouco conhecida ou disseminada entre nós pesquisadores brasileiros. 

 

Realizada a vinda de Renè Barbier, em seguida, em maio de 1995, foi a vez de contarmos com a presença de Alain Coulon, e em novembro desse mesmo ano, com a presença de Jacques Ardoino, ambos professores da Universidade Paris 8.

 

Considero este período (1992/1995), como momento gerador de longo processo que frutifica no campo acadêmico e da produção científica na educação, com resultados expressivos ainda nos dias atuais. Como forma de se resgatar o perfil embrionário deste modo de se produzir e disseminar conhecimentos, oportunizando formação e o intercâmbio de ideias, segue abaixo o que escrevi em agosto de 1998, e que se encontra na última página do livro “Multirreferencialidade nas ciências e na educação”. Aliás, todas as referências neste breve texto pertencem ao trabalho ora disponibilizado.

 

A primeira consequência agradável dessas presenças entre nós foram as publicações dos trabalhos de Alain Coulon (Etnometodologia; Etnometodologia e Educação e Escola de Chicago pelas Editoras Vozes e Papirus) e, agora, o número especial da Revista Pratiques de Formation-Analyses (números 25/26 de Abril de 1993) todo ele dedicado a abordagem multirreferencial (no campo da formação e das ciências em educação), sem contar com o livro do Sérgio Borba publicado em 1997, (Multirreferencialide na formação do professor-pesquisador: da conformidade à complexidade) e o trabalho coletivo, também lançado nesta ocasião juntamente com a presente tradução (Reflexões em torno da abordagem multirreferencial pela Editora da UFSCar).

 

A segunda consequência importante, resultado deste encaminhamento gerador e criativo, no sentido de realizar eventos acadêmicos em que fosse possível, ao máximo, a participação de muitos no planejamento e execução; a interação densa entre os profissionais convidados e aqueles que os recebia; a produção de resultados como mencionado acima e, particularmente, a instituição de uma rede de pesquisadores e instituições que foram se aglutinando ao redor desse projeto coletivo que, considerando o ano de 1998, consolida-se a partir das cinco instituições (Universidades Federais de São Carlos, Bahia, Alagoas; Universidade de Brasília e PUC de Porto Alegre) que em setembro/outubro de 1998 viabilizaram a vinda, pela segunda vez, do Professor Jacques Ardoino.

 

Voltarei posteriormente a falar deste percurso originário e original que compreendo como marcante quanto aos encaminhamentos e resultados posteriores, principalmente considerando as parcerias que se consolidaram a partir de então, incluindo além de mim, os professores Roberto Sidnei Macedo e Sérgio da Costa Borba, o primeiro da Universidade Federal da Bahia (UFBA) e o segundo a Universidade Federal de Alagoas (UFAL). Assim, de forma plural quanto a nossas itinerâncias formativas e inserções institucionais, assumindo antropofagicamente a abordagem epistemológica multirreferencial como apresentada de modo particular por Jacques Ardoino e Guy Berger, não deixando de fora outros profissionais da Universidade Paris 8, fomos consolidando neste período aproximado de 25 anos, um projeto em ato e/ou uma práxis com resultados marcantes no campo da educação, seja na formação de mestres e doutores; na  produção de dissertações e teses; produção de livros e artigos científicos, como na realização de eventos acadêmicos sempre atuando e mantendo a perspectiva do olhar plural/multirreferencial.

 

O objetivo desta página é oportunizar a todos que se interessarem por uma imersão nesta perspectiva epistemológica, por encontrarem nela contribuição potente para se pensar e praticar educação para além do mesmo e da conformidade, inicio por socializar alguns dos trabalhos de minha responsabilidade, produzido no decorrer deste período, considerando o ano de 1992 como marco inicial quando oportunizamos a vinda do Professor Renè Barbier. O propósito ainda é o mesmo que me motivou a levar adiante as possibilidades de tradução e publicação em nosso país, do número especial da Revista Pratiques de Formation-Analyses sobre a abordagem multirreferencial, por reconhecer que muitos outros profissionais e pesquisadores no campo da Educação gostariam de ter acesso e debater tal aprendizagem.

 

 

 

Joaquim Gonçalves Barbosa

Professor Aposentado pela UFISCar

Mossoró 16/12/2018